23 de fev. de 2009

A TEOLOGIA E A BIOÉTICA

A Teologia e a Bioética
Em sua palestra, o professor e padre brasileiro Márcio Fabri dos Anjos inicialmente procurou mostrar as dificuldades para se incluir a teologia no diálogo interdisciplinar da Bioética, sugerindo que isso só será possível e proveitoso se a teologia e as ciências se libertarem de alguns preconceitos.
"Cresce a consciência de que as realidades são por demais complexas, para serem compreendidas por uma só forma de saber, isoladamente. As ciências não são neutrais, nem os cientistas e teóricos são desprovidos de interesses", argumentou.
A Bioética, portanto, poderia ganhar muito com a libertação de preconceitos que cercam o diálogo interdisciplinar, do qual ela se nutre. E a teologia, considerou, tem uma importante contribuição nesta questão, "especialmente diante dos fundamentalismos religiosos".
Na segunda parte de sua palestra, Márcio Fabri dos Anjos apresentou algumas perspectivas da Teologia da Libertação, que poderiam ser usadas em Bioética. "A Teologia da Libertação lidou frontalmente com o poder, desde a época do governo Ronald Reagan. Até então, a Igreja da América Latina era totalmente favorável ao sistema", lembrou.
Sua proposta, em resumo, é implementar um diálogo "olho no olho" e contra os discursos fechados. "Uma observação bioética relativa à libertação, diante das desigualdades. Usar o 'poder de Deus', isto é, o 'poder do discurso religioso' em Bioética, para perceber e entender essas desigualdades, ouvindo a voz dos empobrecidos", ressaltou.
Para o padre, outra compreensão sobre Deus é possível, ou seja, a de que Ele não "compete" com o ser humano e não impõe sua "onipotência opressora". O Poder criador de Deus "confere ao ser humano poder e liberdade. É um potencializador do dom da vida e não da morte".
Qual é o papel de Deus na Bioética Contemporânea?

Alastair Campbell - Essa realmente é uma questão complicada. Acho que vivemos numa sociedade plurarista, onde todas as coisas parecem relacionadas à Bioética. Mas... sim, para mim, a Bioética pode nos ajudar a concluir que Deus ama a todas as pessoas e é um apaixonado por justiça.
Há princípios cristãos, similares em quase todas as religiões que, de certa forma, parecem estar "embutidos" naqueles que dão sustentação à Bioética. Veja, o da Beneficência, Ame seu próximo como a si mesmo, o da Não-Maleficência...
Por outro lado, há grandes diferenças. Por si só, a história do cristianismo demonstra que as pessoas vêm sendo tão autoritárias! A autonomia emocional, por exemplo, que é muito forte em Bioética, passa longe dos princípios cristãos.
Acho que toda a questão acaba num balanço: a Bioética tem muito que aprender com religião e a religião, muito que aprender com a Bioética. É mútuo.
H.T. Engelhardt Jr - Primeiro, gostaria de dizer que não existe uma determinada Bioética contemporânea. Há uma Bioética secular e várias "Bioéticas" cristãs, judaicas e inseridas em outras religiões.
Sou um autor cristão: sei aonde Deus vive e que tem poder no que faz. Mas somente se abrirmos nosso coração a ele iremos "vê-lo", com certeza.
Mas a mensagem que eu escrevi sobre o Cristianismo é que, no final, a verdade não é "o que", mas "quem". Somos todos uma espécie de "estranhos morais".
Meu discurso aqui no Congresso foi justamente o da esperança de que nós consigamos encarar pacificamente nossas diferenças e aprendamos a conviver com elas. O caminho é o da tolerância.
Existem diferenças reais entre os pensamentos bioéticos e o da maioria das religiões. Nem acho que partam dos mesmos princípios... Temos, portanto, que viver com todas essas diferenças, ainda que não compartilhemos dos mesmos princípios.
Márcio Fabri dos Anjos - Ao falarmos de Deus, passamos imagens que podem ser diferentes daquelas que experimentamos sobre ele. É freqüente possuirmos uma religião externa, inclusive de negação e, bem no fundo do santuário do nosso coração, termos um encontro diferente com Deus. Essa diferença sobre o que é o discurso e o que é vida sempre causa estresse.
A Bioética é, para mim, o momento do discurso. Ou seja, da reflexão e de sistematização.
Dentro da Bioética confluem muitos ruídos, que advém do discurso ruidoso. Por vezes, a Bioética se refere a uma imagem de Deus carrancuda, usurpadora de poder, concorrente do ser humano... Deus é "visto" por meio de uma fotografia muito desfocada, que mostra um ângulo errado, não revelando quem Ele é, na sua grandeza e beleza.
É uma fotografia que apresenta Deus como um monarca, numa concepção instrumental em que ser "O Senhor" significa ser o dono de tudo, dono do "eu posso fazer e desfazer". Essa é uma figura que não traduz Deus. É uma analogia impertinente.
Então, dentro da Bioética, o importante é tentarmos desvelar a figura de Deus. Visualizarmos um Deus vivo, experimentado, dinâmico, que se mostra em sinais. O poder da sua atuação nos leva, por exemplo, a ter respeito com as pessoas; a não fazer o mal; a fazer o bem; a ter práticas profundas de justiça e a respeitar a dignidade e a autonomia do outro.

Extraído: http://www.bioetica.org.br/noticias/destaques/destaques_integra.php?id=16

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